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100 anos de dom Tomás Balduíno

É mesmo com devoção que relembro a longa convivência que tive com Dom Tomás. Ele faz parte da multidão de Encantados, e continua, com absoluta certeza, acompanhando e inspirando a cada pessoa com quem conviveu na forma de vida em que nós ainda estamos, e de modo muito particular, a que foi e continua sendo a sua amada Igreja de Goiás.

Ele foi e continua meu mestre desde o primeiro diálogo, no distante ano de 1970. E mestre porque, ao saber que estava disposto a deixar minha região para contribuir na pastoral em outra diocese, logo apresentou um convite, não em nome pessoal apenas, e sim a partir do mandato que a Assembleia Diocesana lhe tinha dado: que convidasse pessoas para uma equipe que devia assumir a formação e capacitação de lideranças, e não apenas para as pastorais, e sim também lideranças que assumissem a necessária organização popular para lutar em favor dos direitos de todas as pessoas.

Primeiro aprendizado, nesse diálogo que mudou minha vida ao aceitar o convite apresentado: para ser fiel à palavra e ao exemplo de Jesus de Nazaré, nosso mestre em humanidade e divindade de vida, bem como para acolher e colocar em prática as orientações inspiradoras do Concílio Vaticano 2º e da Conferência de Medellin, em que a Igreja da América Latina e do Caribe acolheu o Concílio de forma criativa para a realidade desta região, a vivência da Igreja de Goiás devia ser a da fraternidade real, expressa na prática da constituição de assembleias desde as bases até o âmbito diocesano. Entendi que o convite era para entrar numa experiência eclesial comunitária, assemblear.

Quando apresentei a ele a necessidade que sentia de conhecer de forma direta a religiosidade, bem como a realidade de vida da população para ter melhor condição de contribuir na formação de lideranças, imediatamente foi acolhida, e fui conviver e animar o surgimento de comunidades eclesiais e populares em Itapuranga e, ao mesmo tempo, sendo parte da equipe diocesana de assessoria e formação de lideranças.

Não quero me alongar, mas preciso pelo menos fazer mais alguns destaques do que aprendi com Dom Tomás e com o povo da Igreja de Goiás.

O Concílio e Medellin destacaram que a vivência do seguimento de Jesus de Nazaré não pode fechar-se na Igreja Particular. O correto é fazer que ela seja parte da Igreja universal, constituída por pessoas com fé e coração aberto e solidário com todas as Igrejas e com todos os povos. Por isso, para Dom Tomás, e para todas e todos que o tivemos como mestre, assumir as necessidades dos povos indígenas do país reforçando o Conselho Indigenista Missionário, assim como apoiar mundo camponês, contribuindo com a missão nacional da Comissão Pastoral da Terra, sempre foi dimensão tão importante da Igreja de Goiás como o foi a busca de interligação nacional das Comunidades Eclesiais de Base. Na verdade, tudo isso foi assumido como parte orgânica da opção pelos pobres, com eles e elas partilhando as angústias e esperanças, como sugerido no documento sobre a Igreja e o Mundo de Hoje do Concílio Vaticano 2º. E o mundo interligava a realidade das comunidades locais com as comunidades e povos de todo o Planeta.

Quero destacar, por fim, como Dom Tomás, e eu junto com ele, sempre esteve aberto a aprender, evitando fechar-se em formas equivocadas de entender a produção de conhecimentos e as tradições. Tudo está sempre em aberto e, ao mesmo tempo, tudo tem raízes profundas na história humana e eclesial, e por isso, o melhor caminho é retomar as fontes da fé e do conhecimento e buscar tudo que for preciso para compreender os sinais dos tempos, procurando responder aos seus desafios e novas possibilidades a serviço da libertação dos filhos e filhas de Deus.

Foi certamente essa abertura de coração e de inteligência que nos possibilitou descobrir que a Terra, casa comum da humanidade e de uma infinidade de outros seres vivos, já não dava, e não dá conta até hoje de manter-se em equilíbrio climático por causa das agressões que o mal chamado desenvolvimento, confundido interesseiramente com crescimento econômico sem fim por empresas e países ricos. Ao retomar a fonte que está na Carta aos Romanos, capítulo 8, acolhemos o clamor da Terra em suas dores de parto, desejando libertar-se, junto com os filhos e filhas de Deus, de quem a domina e explora. E junto com o Papa Francisco, que acolhe novos conhecimento científicos para compreender melhor esses desequilíbrios da Terra, assumimos a missão de cuidar da vida da Terra e dos pobres, que, mesmo sem ter provocado o desequilíbrio, pagam os custos mais altos das enchentes, das secas, da elevação das águas dos mares.

Obrigado, Dom Tomás, por ter sido nosso mestre no seguimento de Jesus de Nazaré e por continuar abençoando-nos para que estejamos atentos aos sinais dos tempos, dispostos a novas conversões, como a conversão ecológica, sugerida pelo Papa Francisco, e a termos liberdade e coragem para buscar novas maneiras de relacionar com as pessoas e povos empobrecidos, filhas e filhos amados de Deus, e com a nossa Mãe Terra.

Ivo Poletto, dezembro de 2022

 

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