InícioBispo DiocesanoA Voz do PastorO amor é o grande distintivo do cristão

O amor é o grande distintivo do cristão

Reflexão do Evangelho do V domingo da Páscoa (Jo 13,31-33a.34-35)

A paz esteja com vocês.

Esta foi a primeira saudação do ressuscitado aos seus apóstolos (cf. Jo 20,21), trazendo a plenitude dos dons de Deus, também destacada pelo novo papa no seu primeiro discurso.

Neste quinto domingo da Páscoa, o Evangelho traz duas fortes mensagens: a glorificação do Pai e de Jesus (vv. 31-31), e o seu novo mandamento: amai-vos uns aos outros (v. 34).

O texto deste domingo é parte de um longo discurso de despedida de Jesus, proferido durante a Última Ceia. Ele faz uma bonita síntese da sua vida e deixa o seu testamento para a comunidade, com o desejo de que fique marcado para sempre na memória e no coração dos seus discípulos.  A primeira ideia destacada é a glorificação. Cinco vezes Jesus menciona essa palavra: três vezes fala em “glorificado” e duas vezes em glorificará (vv. 31-32).  O Filho é glorificado pelo Pai, que também o glorifica, e será glorificado pelo Pai no futuro.

Jesus afirma: “agora foi glorificado o Filho do Homem e Deus foi glorificado nele” (v. 31). O “agora” refere-se ao momento em que Judas sai para entregá-lo, marcando o início da paixão, que será o triunfo do amor de Jesus. A glória de Deus, não está em tronos ou espetáculos, mas na cruz, amor infinito dele no seu Filho Jesus. No início do seu Evangelho, João diz que o Verbo de Deus se fez carne e nós vimos a sua glória, que Ele possuía junto do Pai (cf. Jo 1,14). No rosto humano e misericordioso de Jesus, nos seus gestos de cuidado, nas suas lágrimas, no seu abraço aos pobres, na sua crucifixão está a revelação da glória de Deus.

No primeiro testamento, a glória de Deus, invisível, se manifestava de diversas formas: no brilho do rosto de Moisés (cf. Ex 34,29.35); nos fenômenos cósmicos espetaculares e até mesmo assustadores: fogo, relâmpagos, trovões, tempestades… eventos que ao mesmo tempo atraíam e provocavam medo. Para o evangelista João, a glória de Deus se manifesta na encarnação do seu Filho, na pequenez humana, no mistério da cruz. Conforme Santo Irineu, a glória de Deus é o ser humano pleno de vida. O nome de Deus “é glorificado naqueles que morrem defendendo a vida”. Para o futuro, a glória de Deus se manifestará no Filho ressuscitado, fonte de vida para a humanidade.

A segunda ideia do Evangelho é o novo mandamento deixado por Jesus: “amai-vos uns aos outros. Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros” (v. 34). Jesus não pede, ordena amar, como Ele nos amou, sem limites, sem exigir reciprocidade, sem olhar se merecemos.  A glória de Jesus deve manifestar-se nas relações amorosas entre os seres humanos. O amor é o sinal que distingue o cristão no mundo. Pelas relações amorosas os cristãos são reconhecidos. De fato, já no Séc. II, conforme Tertuliano, os que não acreditavam em Jesus, ao observarem os cristãos, afirmavam admirados: “vejam como eles se amam! ”. Será que pode ser dito isto de nós hoje?

Infelizmente, algumas vezes ocorrem divisões, brigas, intrigas, violência… E o pior: alguns fazem isto em nome de Deus, em defesa da moral, da família, da pátria. Em nome da fé, tentam justificar o ódio e a exclusão do diferente. Isso é muito triste. Como disse o saudoso papa Francisco, não podemos ser cristãos “de aparência”, carregados de símbolo, mas sem amor no coração. O que define a nossa fé não é uma grande cruz no peito, mas o tamanho do amor no coração. Os símbolos têm seu valor, mas devem chamar a atenção não para quem os usa e sim para o que representam. Quem defende o ódio em nome da fé envergonha os que realmente creem, decepciona quem precisa ser amado e dá um contratestemunho ao mundo. O que nos identifica como cristãos é o amor!

Jesus, no evangelho de hoje, manifesta o seu carinho pelos apóstolos chamando-os filhinhos, falando com ternura e ordenando: “amai-vos uns aos outros”. Esse amor não é apenas aos amigos, aos irmãos da comunidade, da família. Jesus vai além, pedindo para amarmos até mesmo os inimigos (cf. Mt 5,43-48; Lc 6,27-28), as pessoas que nos machucam, aqueles dos quais discordamos. Isto não significa concordar com as injustiças, mas não permitir que o ódio se instale no nosso coração. Não é fácil viver esse pedido de Jesus, mas” não há amor sem a experiência da pura graça” (Tolentino, A mística do instante, p. 95).

Mas o que é amar? Que tipo de amor Jesus espera de nós? Os filósofos gregos antigos classificavam o amor em três categorias: Eros, amor que envolve a afetividade e intimidade entre o casal e exige lealdade e ser correspondido; Philia, que se refere à amizade e exige reciprocidade e compartilhamento de interesses; e Ágape, que é o amor gratuito, que não espera recompensa alguma. É esse amor que Jesus espera de nós. Amar como Ele nos amou, sem impor condições.

Para Santa Teresinha, amar é doar-se é dar a própria vida. São Charles de Foucauld, que no dia 15 passado fez 3 anos de canonização, diz que a medida do amor é a imitação. Ele via o amor concreto como uma forma de despertar a curiosidade para a fé em Jesus Cristo, a quem ele imitava colocando a vida a serviço dos últimos.

No tribunal divino, conforme o filósofo francês Jean Guitton, ouviremos a pergunta: “tu amaste?” Não importa ao juiz divino saber os títulos humanos que conquistamos, as orações que fizemos, mas se o que fizemos foi movido pelo amor. Essa pergunta deve nos questionar todos os dias: “eu tenho amado de verdade? ”  Só entra no céu quem ama e permite ser amado!

O nosso grande desafio é amar e deixar-se amar, tornando o evangelho uma realidade no nosso cotidiano. Quem ama, agrada a Deus, dá sentido pleno à sua existência. Quem odeia, porém, não apenas desperdiça a própria vida como destrói a vida dos outros e constrói sua própria infelicidade.

Nesta semana, reflitamos: como tenho amado? Tenho deixado o amor de Deus e dos irmãos penetrar e transformar a minha vida? Com meus atos tenho glorificado a Deus?

Na alegria pascal e com renovada esperança, acolhemos o Papa Leão XIV, sucessor de Pedro no pastoreio da Igreja. Que o Espírito Santo o ilumine e fortaleça no cumprimento desta sublime missão. Que seu ministério seja marcado pelo serviço humilde, pela misericórdia e pelo diálogo fraterno, buscando construir pontes que nos unam, seguindo o mandamento de Jesus: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”! A ele nossa comunhão e orações.

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