InícioBispo DiocesanoA Voz do PastorCom Jesus ressuscitado o sol brilha, a pesca é abundante.

Com Jesus ressuscitado o sol brilha, a pesca é abundante.

Pedro respondeu a Jesus: “Senhor, tu sabes tudo; tu sabes que eu te amo” (Jo 21,17)
O Evangelho deste III domingo Pascal apresenta-nos duas cenas significativas: a primeira narra a terceira aparição de Jesus ressuscitado a sete apóstolos junto ao mar de Tiberíades; a segunda relata a confirmação da missão confiada a Pedro. Esse grande lago é chamado pelos outros três evangelistas de mar da Galileia ou lago de Genesaré. Eles evitam o nome utilizado por João por ser uma homenagem ao imperador romano Tibério. A intenção de João é mostrar o mar como campo de missão universal.

O Evangelho nos mostra sete apóstolos, número que simboliza a totalidade das nações, seguindo Pedro em seu retorno à pesca. A cena representa as fugas da comunidade que ainda não tinha clareza sobre o seu futuro; mas significa também a ação missionária entre os pagãos, representados pelo mar. Conforme os evangelhos sinóticos, os apóstolos foram convidados a deixar de pescar peixes para pescar homens. Agora eles não podem retroceder, pois a vida nunca mais será a mesma depois do encontro com o ressuscitado, que reafirma a sua missão e renova o sentido dado à existência deles.

O Evangelho diz que os apóstolos entraram na barca, símbolo da Igreja, mas nada pescaram. A noite infrutífera de pesca simboliza a crise da comunidade missionária, sem a luz de Cristo ou do Espírito (cf. Jo 9,4-5). Ao amanhecer, João apresenta Jesus de pé na margem (v. 4), demonstrando sua condição de ressuscitado, mas os discípulos ainda não sabiam que era Ele. Jesus ordena lançar as redes à direita do barco e o resultado é a pesca de uma multidão de peixes (v. 6), simbolizando a fecundidade da missão. Sem Jesus é escuridão, a pesca é um fracasso. Sem Ele nada podemos fazer (cf. Jo 15,5). Com Ele o sol brilha, a pesca é abundante. A palavra dele faz a rede se encher, dá eficácia ao trabalho missionário.

Dois apóstolos se destacam: Pedro e o discípulo que Jesus amava, primeiro a reconhecê-lo. Pedro veste-se apressadamente, gesto que evoca tanto o desejo de reconciliação com Jesus e seu projeto – pois não o aceitara como servidor e o negara três vezes – quanto a disponibilidade em servir, como Jesus que vestiu o avental para lavar os pés dos apóstolos (Cf. Jo 13,4). Ao jogar-se no mar, Pedro mostra sua disposição em correr riscos na missão.

Os 153 grandes peixes apanhados na rede arrastada por Pedro, conforme São Jerônimo, representavam o número de todas as espécies conhecidas e catalogadas pelos zoólogos gregos. Apesar da grande quantidade, a rede não se rompeu. Isto mostra que a ação missionária da Igreja abarca toda a humanidade e sem ruptura.

Ao pisarem a terra, os discípulos viram brasas acesas, com peixe em cima e pão. Jesus pede que levem alguns peixes e os convida a comer (vv. 9-10). Jesus toma o pão e distribui a eles. Faz a mesma coisa com o peixe (v. 13). Este gesto recorda a Eucaristia, remetendo ao discurso sobre o Pão da vida no capítulo 6 do Evangelho de João (cf. Jo 6,13).

Na segunda cena (vv. 15-19), Jesus dialoga com Pedro e o confirma em sua missão pastoral, após a tríplice interrogação se o amava, com a tríplice confirmação do amor de Pedro, destacando na terceira resposta que Jesus sabe tudo, sabe que o ama (vv. 15-17). A pergunta dirigida três vezes recorda a tríplice negação de Pedro. A declaração de amor, reiterada sem arrogância por Pedro, manifesta seu desejo incondicional de segui-lo. Contudo, o chamado de Jesus independe dos méritos de Pedro, que se torna rocha por graça divina. A fortaleza dele vem unicamente do Senhor.

Pedro recebe a missão de cuidar do rebanho de Jesus, deve zelar para que o seu amor se prolongue na história. Como Jesus doou a vida pelas ovelhas, também ele deve doar a sua. A referência ao martírio de Pedro encontra-se na expressão “estender as mãos”, recordando os condenados à crucifixão que estendiam os braços para carregar a trave superior da cruz. E a expressão deixar-se cingir e ser conduzido onde não se quer ir (v 18), lembra a corda amarrada para conduzir os condenados à morte. Como Jesus, Pedro também será crucificado, mas de cabeça para baixo, no ano 65, segundo a tradição.
Com tristeza e saudade, acompanhamos a partida do querido Papa Francisco, sucessor de Pedro. Sua vida foi testemunho de amor a Cristo, especialmente presente nos sofredores: pobres, famintos, enfermos, migrantes e vítimas da violência. Apesar da dor, a fé na Ressurreição nos conforta e sustenta. Confiamos ao Senhor este querido pastor latino-americano, amigo dos pobres e incansável promotor da paz. Que junto a Deus ele interceda por nossa América Latina e pelo mundo dilacerado pelas diversas formas de violência. Seu legado nos desafia a viver o Evangelho com a mesma coragem e compaixão que marcaram seu ministério.

Quem gosta de pescar sabe como é triste e decepcionante não pegar um peixinho sequer. Era esse o sentimento que experimentava aquela comunidade retratada na pesca por João. Também corremos esse risco. Escutamos que algumas lideranças estão cansadas, que não há renovação, que muitos agentes de pastorais se encontram desanimados e as diversas vocações são escassas. É a sensação de que prevalece a morte. Mas a Páscoa nos assegura a vitória sobre a morte e tudo o que ela significa. É possível renovar a esperança, como nos convoca o Ano Jubilar, reconstruir a fraternidade e reacender o ardor missionário, pois Deus é o Senhor da vida, vencedor da morte.

Na conclusão do 2º capítulo da Exortação Apostólica Evangelii Gaudium (“A Alegria do Evangelho”), que analisa as dificuldades do mundo contemporâneo, o papa Francisco afirma que os desafios existem para serem superados e nos convida a ser “realistas, mas sem perder a alegria, a audácia e a dedicação cheia de esperança. Não deixemos que nos roubem a força missionária! ” (EG n. 109).

+ Jeová Elias Ferreira Bispo de Goiás

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